Perigo na Cozinha

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    No nossa alimentação diária, é comum surgir uma dúvida crucial: como saber se o copo de leite do café da manhã, ou a alface da salada não estão contaminados com hormônios, agrotóxicos ou bactérias nocivas à saúde? Como ter certeza de que o que consumimos não irá trazer danos para a nossa saúde?

    A preocupação com a questão da contaminação e/ou intoxicação alimentar é ainda maior a cada dia que passa. A ameaça do bioterrorismo, que assusta governos e populações de diversos países, principalmente dos Estados Unidos, coloca, com mais ênfase, o assunto novamente na ordem do dia, uma vez que os alimentos representam um meio facilitador da disseminação de bactérias. A inquietação com o bioterrorismo alimentar, pelo menos no caso dos Estados Unidos, é anterior aos acidentes de 11 de setembro de 2001. Tanto que, no congresso anual do Institute of Food Technologists (IFT), realizado recentemente na cidade de New Orleans, um dos temas centrais da discussão foi justamente o bioterrorismo.

    No Brasil, a atividade de controle de pontos de contaminação na cadeia alimentar ainda é incipiente, embora se saiba que as grandes indústrias têm seus mecanismos de controle. Segundo especialistas, o principal problema não está na produção dentro das fábricas, mas principalmente ao longo do caminho que o produto percorre até chegar ao consumidor final.

    Comida por quilo

    A alimentação sempre foi uma preocupação para quem está longe de casa no horário do almoço. Comer em restaurantes com sistema self-service requer cuidados ainda mais rigorosos.

    Uma recente pesquisa de mestrado da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP) mostrou que a maior parte das amostras recolhidas nesses estabelecimentos e posteriormente analisadas estavam impróprias para consumo.

    O pesquisador responsável pelo estudo, Alexandre Panov Momesso, percorreu 20 restaurantes da capital paulista. De cada um deles, colheu duas amostras de comida quente e outras duas de alimentos frios. Um total de 66,2% das 80 amostras analisadas estavam inadequadas para consumo: foram detectados microrganismos que funcionam como indicadores de falta de higiene acima do aceitável pela legislação sanitária.

    As duas variáveis que contribuíram de forma efetiva para a contaminação das amostras foram a temperatura e o tempo de exposição dos alimentos nos balcões. Os pratos quentes têm de permanecer a pelo menos 60 graus. Já os frios não podem ultrapassar os 10 graus.

    O fato que mais surpreendeu o pesquisador foi o despreparo dos próprios proprietários dos restaurantes visitados, que mal conheciam a temperatura adequada para a exposição dos alimentos. Apenas 20% das amostras de pratos quentes e 7,5% das de pratos frios estavam dentro da temperatura adequada.

    Para Momesso, deveria haver termômetros dentro dos balcões, como há nas geladeiras de supermercados. Assim, até o consumidor teria como verificar a temperatura em que a comida é mantida. O tempo é outro fator negativo da conservação adequada da comida dos restaurantes: em média, os pratos ficam expostos por quatro horas, o que equivale ao funcionamento das 11h às 15h. Quanto maior o tempo de exposição, maiores as possibilidades de contaminação.

    Roberto Figueiredo, biomédico da Microbiotécnica, empresa de consultoria e treinamento de higiene alimentar, concorda que realmente deveriam haver termômetros indicando a temperatura da comida nos restaurantes, mas entende que esta é uma medida que tem mais finalidade técnica do que prática. “O cliente também vai ficar sem saber se foi feita uma correta higienização dos medidores e se os mesmos estão sendo periodicamente aferidos pelos órgãos competentes”, argumenta.

    Para o biomédico, o problema mais evidente quando o assunto é ligado à higiene dos alimentos ainda é a falta de informação da maior parte das pessoas, sejam elas diretamente ligadas ou não ao setor produtivo. “Cerca de 44% das intoxicações que são verificadas atualmente ocorrem dentro da nossa casa. A cozinha é o local mais contaminado e, nesse ambiente, as esponjas representam uma ameaça à saúde de qualquer ser humano. Elas são ‘depósitos’ de pequenas partículas de alimentos e ainda são úmidas, transformando-se, assim, num verdadeiro ‘esconderijo’ para qualquer microorganismo”, alerta Figueiredo, que recomenda a troca semanal do utensílio.

    Outro problema: os restaurantes pesquisados repõem a comida sem trocar a bandeja. O resíduo que permanece da porção anterior e a temperatura inadequada do balcão contribuem para a proliferação de microrganismos.

    Agentes que podem provocar problemas à saúde estão entre os microrganismos encontrados nas amostras pesquisadas. Um exemplo é a salmonela, bactéria encontrada em quatro amostras de comida, que pode levar até à morte. O principal sintoma das doenças provocadas por alimentos contaminados é a diarréia.

    “Não adianta aquela estratégia utilizada por alguns restaurantes de convidar seus clientes a conhecerem as dependências da cozinha. Essa medida é inócua porque a maioria dos consumidores é leiga e não conhece quais são as principais normas, tecnologias e procedimentos que visam a redução dos riscos de contaminação desses estabelecimentos”, justifica o biomédico. Figueiredo aconselha que os restaurantes devem providenciar uma espécie de ‘protetor de vidro’, cuja localização deve estar entre os alimentos e a pessoa que se serve, para evitar que fios de cabelo e outras pequenas sujidades contaminem os pratos. Ele ainda recomenda que os clientes devem ficar atentos com os alimentos quentes, que devem emitir vapor.

    Instalações

    No Brasil, o número de casos de toxinfecções ou intoxicações químicas e naturais, ocorre, em sua maioria, em estabelecimentos de serviços de alimentação. Garantir a saúde e segurança do consumidor deve ser o interesse prioritário dos administradores de cozinhas comerciais e industriais, considerando que a possibilidade de ocorrência de uma intoxicação entre os clientes pode trazer danos irreparáveis à imagem do estabelecimento. “O responsável pela cozinha, seja o administrador, nutricionista, gerente ou proprietário, deve, em primeiro lugar, possuir um projeto físico da área em questão, que deve considerar todos os aspectos de fluxo e segurança alimentar.

    Deve, também, criar procedimentos que evitem qualquer possibilidade de contaminação e, por último, deve considerar toda a equipe, como fornecedores, cozinheiros, assistentes, e etc, como principais responsáveis pela segurança alimentar na cozinha, utilizando, para isso, treinamento constante para que todos os procedimentos sejam seguidos corretamente”, aconselha o arquiteto e consultor especializado em bares, restaurantes e cozinhas comerciais e industriais, Eric Zompero.

    Um importante ponto a ser considerado é a presença de um profissional habilitado, registrado no Conselho Regional. Antes da implantação da cozinha, um arquiteto ou engenheiro especializado poderá criar um projeto que considere todos os aspectos que garantirão a segurança alimentar do estabelecimento, desde fluxos de produção, até a escolha dos materiais apropriados. “Sob o ponto de vista construtivo, a cozinha deve ser um ambiente isolado e limpo. Os materiais de acabamento e os equipamentos devem evitar a proliferação de agentes contaminates, odores, sujeiras e qualquer partícula que possa provocar a contaminação de qualquer alimento.

    conselha-se também que os ambientes, ou pelo menos açougue e padarias, sejam refrigerados, garantindo uma temperatura constante durante a produção”, informa Zompero.

    Pedras, como granitos e mármores, apesar de permitirem também o aparecimento de fissuras ou degeneração do material, têm seu uso previsto em áreas de manipulação de massas. Assim, sua higienização deve ser constante, procedendo sempre a sua completa secagem, já que a água é um dos principais agentes promotores de contaminações.

    Planos de trabalho e equipamentos devem ser lisos, livres de rachaduras, áreas expostas e não expostas de difícil acesso e qualquer imperfeição. Equipamentos com câmaras fechadas, como fornos, refrigeradores, estufas etc, devem possuir cantos e arestas internas sem ângulos retos. Junções entre mesas e equipamentos devem ser realizadas em juntas fechadas, sempre preenchidas para evitar frestas onde possam ser alocados agentes patológicos.

    Outro aspecto importante é a manutenção. Todos os equipamentos devem estar sempre em perfeitas condições de uso, evitando acidentes com funcionários. “Superfícies de corte devem estar sempre novas. Caso haja arranhões derivados de constante uso, devem ser imediatamente trocados. Placas de polietileno devem ser utilizadas, evitando a contaminação cruzada entre produtos. Paredes sujas, não pintadas, fissuradas, ou equipamentos oxidados, entre outros, são possíveis pontos de desenvolvimento de agentes patogênicos”.

    O consultor ainda explica que, no caso de acabamentos como cerâmicas para pisos e paredes, quanto maiores as peça, ou seja, quanto maior sua área, mais seguro, uma vez que as áreas de rejuntes, típicos propagadores de agentes patogênicos, ficam reduzidos. Deve-se optar por cerâmicas de qualidade, garantidas pela empresa fornecedora, que não devem ser porosas, não devem ter alto índice de absorção de água, devem ser de fácil limpeza e manutenção e não escorregadias.

    As janelas externas devem sempre possuir telas plásticas e metálicas a fim de evitar a presença de insetos e roedores, grupos de grande riscos de proliferação de contaminações. “As áreas de acondicionamento de lixo devem, obrigatoriamente, estar totalmente isolados da cozinha. Em locais onde o recolhimento do lixo não seja diário, é aconselhável a refrigeração dessas áreas, evitando a rápida degradação do lixo, o que provocaria os odores característicos e a presença de insetos”, finaliza.

    O que existe no alimento que o torna contaminado?

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