Milho negro ainda é pouco explorado no Brasil, mas pode atender a um importante nicho de mercado
O milho é um dos cereais mais consumidos no mundo, sendo que o Brasil ocupa a quarta posição dentre os principais degustadores mundiais desse alimento, atrás apenas dos EUA, China e União Europeia, segundo dados divulgados pelo Departamento de Agricultura Americano (USDA). O mesmo órgão projetou expectativa de que o consumo do grão pelos brasileiros alcance 61,5 milhões de toneladas em 2018. A previsão para os EUA é de cerca de 318,7 milhões de toneladas, o que representa uma participação de quase 30% no consumo total mundial. Já a China deve demandar 240 milhões de toneladas de milho em 2018, ou seja, 22,5% do total consumido em todo o planeta.
Além de ser uma excelente fonte energética devido ao seu alto teor de carboidratos, o milho apresenta diferentes colorações, como o amarelo, o vermelho e o negro, que tem se tornado cada vez mais popular na China. Tanto que, conforme divulgação do portal Fresh Plaza, desde o momento que o milho negro foi lançado no mercado chinês há poucos anos, o fornecimento do grão não foi capaz de satisfazer a demanda. Com isso, assim que o grão é colhido, ele já é comprado por clientes de Hong Kong e alguns outros países.
No Brasil, o milho amarelo, também conhecido como milho verde, é o mais popular. Apesar de o milho negro apresentar potente efeito antioxidante, o grão escuro e seus outros grandes benefícios nutricionais ainda são restritos ao conhecimento de poucos agricultores familiares, como conta Flaviane Malaquias Costa, agrônoma e doutoranda em Genética e Melhoramento de Plantas pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (ESALQ/USP).
“Atualmente, no Brasil, não há plantio comercial em nível de mercado de milho negro, pelo menos dentro do meu conhecimento. O cultivo comercial de milho no país é majoritariamente amarelo. Assim, o milho negro é produzido por agricultores familiares por meio de variedades locais, principalmente, para o autoconsumo da família”, explica a pesquisadora.
Segundo Costa, o milho negro pode apresentar valores nutricionais superiores ao amarelo. No entanto, ela enfatiza que o valor nutricional associado à cor de grão é uma característica que exige detalhado estudo. “O milho negro pode possuir coloração mais escura em consequência de uma maior concentração de carotenoides no grão. Os carotenóides são pigmentos vegetais, benéficos à saúde, os quais possuem propriedades antioxidantes, anti-inflamatórias e podem ser convertidos em vitamina A. Por isso, o milho negro pode apresentar valores nutricionais superiores ao amarelo. No entanto, o valor nutricional associado à cor de grão é uma característica complexa e deve ser diagnosticado por meio de uma análise nutricional. Por exemplo, uma variedade de milho negro que possui apenas a cor do pericarpo (camada exterior da semente) escura, não necessariamente apresentará valor nutricional superior a um milho amarelo, se esse último apresentar maior concentração de propriedades nutricionais nas outras camadas internas da semente. Portanto, o milho negro possui potencial de alto valor nutricional e merece ser preservado e valorizado, mas para afirmar que um tipo de milho é nutricionalmente superior que outro é importante verificar por meio de análises nutricionais. Além disso, a qualidade nutricional pode variar conforme o modo de preparo de um alimento, no caso do milho, considerar se o grão é moído, inteiro, torrado, in natura cozido ou assado”, enfatiza.
Origem e plantio
A origem do milho é cercada por várias histórias. Porém, conforme a doutoranda em Genética e Melhoramento de Plantas Costa, “atualmente, a teoria de maior consenso acadêmico indica que o milho se originou no México, na região do Vale do Rio Balsas. A espécie se dispersou por toda a América há milhares de anos, gerando ampla variabilidade genética, dentro da qual existe o milho negro. Eu desconheço uma indicação na literatura científica que indique um local de origem específico para o milho negro”, relata.
Além do milho negro, vermelho e roxo, existem outras diferentes colorações do grão, como o alaranjado, rosado, creme, branco, rajado, multicolorido, entre outros. “Esses milhos são mantidos e cultivados pelos agricultores familiares e pelas comunidades indígenas de todo o Brasil, além de outros países da América do Sul e América Central. No México, centro de origem do milho, concentra-se grande variabilidade da espécie, mas, no Brasil, também possuímos grande diversidade de variedades locais. Por isso, somos considerados centro secundário de diversidade de milho”, afirma Costa.
Já sobre a forma de plantio, a pesquisadora diz que o milho negro não requer cuidados especiais e muitas diferenciações em relação ao milho amarelo. “Não há diferenças específicas para o plantio de milho negro em relação ao milho amarelo. Mas, em nível de consumo, existem variações regionais por cada país, o que envolve costumes locais e gastronomia de pratos típicos preparados a partir do milho, associados a traços culturais, em diferentes regiões”.
Mercado industrial
Segundo Nelson Arnaldo Kowalski, presidente da Associação Brasileira das Indústrias do Milho (Abimilho) e representante na Câmara Setorial do Milho e Sorgo, ele não tem conhecimento de alguma empresa que trabalhe com milho negro no Brasil. Entretanto, ele acredita que o grão escuro “é um importante nicho de mercado, principalmente na alimentação humana, culinária gourmet”, ressalta.
Kowalski afirma que a Abimilho congrega as principais empresas de processamento de milho do país, o que representa 70% da produção nacional de produtos de milho para consumo humano. No entanto, ele revela que o mercado industrial de milho no Brasil não está em expansão como o chinês. “O mercado industrial de milho está sentindo os mesmos efeitos da economia nacional, com o declínio do PIB em 9%. Porém, há o aparecimento de usinas de processamento de etanol de milho, nas fronteiras agrícolas, setor novo em expansão”, avalia.
Segundo o presidente da Abimilho, as variações do grão mais industrializado no Brasil são o “milho hibrido, sendo convencional ou transgênico, milho pipoca, que tem uma representativa importante no setor, e milho doce, que é o milho verde, usado em conservas”, detalha.
Em relação à melhor forma de industrialização do milho, Kowalski explica que esse fator depende da destinação do uso do grão. “Os produtos pelo processo via úmido tem por característica a retirada das proteínas e o aproveitamento do amido e suas modificações. Já os produtos pelo processo via seco têm por características a preservação dos grãos e sua utilização pode ser alimentação direta, extrusão processamento de outros produtos”, conclui.
Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (ESALQ/USP)
www4.esalq.usp.br
Associação Brasileira das Indústrias do Milho (Abimilho)
www.abimilho.com.br