Protagonismo Feminino

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    A chef Kamilla Seidler, natural de Copenhague, na Dinamarca, chegou à Bolívia em 2012 para participar de um projeto de culinária. Ao comandar a cozinha do Gustu, em La Paz, seu talento na cozinha não passou despercebido e rendeu a ela o título de melhor chef mulher da América Latina neste ano.
    Desde 2013 no restaurante boliviano, a chef chamou a atenção em relação ao seu jeito de cozinhar. Misturando ingredientes da região com a experiência acumulada nos últimos anos, Kamilla conquistou olhares de importantes críticos gastronômicos. Além de reforçar o talento da chef, esse prêmio também mostra relevância de mulheres no mercado gastronômico.
    O prêmio recebido veio do Latin America`s Best Female Chef Award, que havia eleito Roberta Sudbrack em 2015. De acordo com o organizador da premiação, William Drew, essa categoria serve para “destacar as conquistas das grandes chefs em uma indústria dominada por homens, servir de inspiração para as gerações futuras e promover diversidade e igualdade”.
    Pensando na importância dessa premiação para o setor de alimentação, a Food Service News conversou com a chef para saber qual a importância dessa conquista em sua carreira. Também falamos sobre os destaques da região, a relevância social para o desenvolvimento local, machismo, entre outras questões.

    Experiência

    Kamilla tem experiência em grandes cozinhas europeias, como no Restaurant Paustian e o Geist, na Dinamarca; o Le Manoir aux Quat’ Saisons, no Reino Unido; e o Mugaritz, na Espanha. A chef é conhecida por seus pratos diferenciados, com ingredientes locais e elegância durante a apresentação. Durante a produção de suas receitas, o toque da culinária boliviana ganhou destaque como uma forma de promover a região e o bom gosto.
    Na Bolívia, os sabores e ingredientes locais têm transformado os pratos produzidos no Gastu. Uma das receitas envolve jacaré com pó de hibisco, por exemplo. A irreverência no modo de produzir essas receitas é uma das características do estabelecimento.
    O Gustu é reconhecido por valorizar os produtos regionais de cada local e isso faz parte de seus princípios desde a fundação. O chef Claus Meyer, grande idealizador do projeto Melting Pot Bolívia, também é o fundador do Noma e do Gustu.
    Meyer desenvolveu o projeto para impactar a gastronomia local e a capacitação de jovens empreendedores e chefs. Também existe o pressuposto de valorizar a biodiversidade do país, focando nos ingredientes mais conhecidos da região.
    O restaurante entrou para a lista da revista “Restaurant”, em menos de dois anos depois de sua fundação. Uma das grandes diferenciações no estabelecimento é usar todos os ingredientes bolivianos, até mesmo nas bebidas servidas pela casa e nas sobremesas. Neste ano, o Gustu ficou em 17° lugar no Latin America’s 50 Best Restaurants.
    Além da paixão pela culinária, estar relacionada com o Gustu mudou a vida de Kamilla e sua carreira como chef. “É uma verdadeira honra ser reconhecida com este prêmio. Eu dediquei minha vida ao mundo da gastronomia e a um sonho chamado Gustu. Esforço-me diariamente para disseminar a mensagem da igualdade de gênero nas cozinhas do mundo; uma mensagem de respeito, dignidade e orgulho por meio da comida, trabalhando incansavelmente para tornar a gastronomia uma ferramenta de mudança social”, conta Kamilla.
    Para conseguir o prêmio, foi necessário muito trabalho e dedicação durante vários anos. De acordo com a chef, a lembrança mais antiga que tem sobre sua experiência gastronômica é quando preparava panquecas com sua avó, sentada no chão da cozinha, mesmo brincando. A vivência dessas experiências a ajudou no desenvolvimento de suas habilidades gastronômicas e na escolha da profissão a seguir.
    A escolha de Kamilla pela gastronomia continua sendo motivo de orgulho e reconhecimento em sua carreira. A chef afirma “sentir-se muito feliz por ser uma pessoa que cozinha”. Assim como vários profissionais renomados em diversas áreas, a paixão pela carreira é um dos fundamentos para fazer algo bem.
    “É um grande prazer ver Kamilla conquistar este título prestigioso. O trabalho que ela desenvolve no Gustu, não só ao criar experiências gastronômicas memoráveis, mas também ao liderar a criação de uma nova cultura culinária na Bolívia, inspirando fazendeiros, produtores e cozinheiros, é verdadeiramente incrível. Parabenizamos Kamilla por sua habilidade, seu compromisso e por seu trabalho excepcional”, reconhece Drew.
    Cenário
    Apesar da conquista de Kamilla, as profissões ainda carregam uma diferenciação histórica tanto de remuneração quanto de cargos. Na culinária, isso não é diferente. Os homens ocupam grande parte da liderança dentro de cozinhas.
    De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra em Domicílio (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres receberam 74,5% do salário dos homens em 2014. Em 2013, essa taxa era de 73,5%.
    Já a Organização Internacional do Trabalho (OIT) mostrou que a presença dos gêneros no mercado de trabalho vai demorar 70 anos para ser igualitária. Em nível global, a diferença entre os anos de 1995 e 2015 diminuiu apenas 0,6%.
    O relatório da OIT também mostrou a participação de mulheres no mercado de trabalho, com apenas 27% do total de vagas ocupadas. O intuito de ter um prêmio destinado às mulheres no setor gastronômico tenta diminuir essas lacunas na desigualdade de gêneros e é um importante passo para chefs em todo o mundo.
    Para Kamilla, assim como qualquer outra profissão, a gastronomia ainda mostra a disparidade entre pessoas. “Várias profissões ainda têm essa desigualdade, mas nós vamos mudar isso”, explica a chef, em um tom otimista.
    Quanto ao futuro, a chef conta que não há nenhuma certeza, mas vai continuar lutando por direitos iguais entre os gêneros e fazendo seu trabalho com muito profissionalismo. “Espero que sejamos capazes de conquistar um grande poder feminino e possamos continuar a crescer coletivamente”, pontua.

    Gastu

    Além do talento de Kamilla, o amor pelo restaurante e seu projeto em representar os ingredientes locais fizeram toda a diferença na carreira gastronômica. De acordo com a chef, o Gustu foi essencial para o reconhecimento de seu trabalho e chama a atenção para o prêmio ser de todos que trabalham no local. “Tenho certeza de que foi decisivo. Nós viemos para a Bolívia com uma missão e o trabalho duro realizado pela equipe, como um todo, nos levou a esse belo reconhecimento”, ressalta.
    Na realização dos pratos no restaurante, a chef chama a atenção para a importância da variedade de ingredientes bolivianos. Segundo ela, a grande vantagem é que a Bolívia tem 12 microclimas e há a possibilidade em utilizar produtos cultivados de 100 a 6000 metros acima do nível do mar.
    A grande função do Gustu é continuar explorando as potencialidades do país e oferecer essa gastronomia aos visitantes. Com os títulos conquistados, o restaurante é reconhecido pelas suas ações e os pratos bem elaborados, atendimento, entre outros aspectos.
    Uma das formas é continuar oferecendo os cursos de profissionalização na área gastronômica para desenvolver o profissionalismo na região. Esse trabalho pode ajudar a continuar desenvolvendo talentos na área culinária e mostrar a importância para o desenvolvimento econômico.
    Culinária Boliviana
    Uma das fortes influências na culinária boliviana é a cultura indígena, mesclando com a herança europeia na região. Dentre os pratos mais conhecidos pelos brasileiros estão a saltenha, um tipo de pastel assado; e as humintas, também conhecidas por aqui como pamonhas. Outro destaque vai para o antichuchos, o espetinho de coração de boi, bem conhecido no país.
    O milho, a batata, o amendoim, a mandioca e o arroz são ingredientes tradicionais da culinária boliviana, que refletem nossa similaridade com a gastronomia de países vizinhos.

    Gustu
    www.gustubo.restaurantgustu.com
    The Worlds 50 Best
    www.theworlds50best.com/latinamerica/en

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